terça-feira, 8 de março de 2011

Vinte e cinco.

Cada dia que passa é um dia a menos na contagem regressiva para os meus vinte e cinco: a exatos dois meses – ontem a Flor me lembrou. Muitos motivos para alegria. Mas há frustrações. Frustra principalmente o fato de que a contemporaneidade exige edifícios. Concluídos, em andamento, iniciados. Quem atinge esse percentual do século – 25 – nunca pode estar no projeto: eu estou. Às vezes me iludo. Saio pelos anos passados procurando o que poderia ter sido feito de útil. Inútil. Olho para o terreno, vazio. A planta, uma folha em branco. Talvez eu esteja edificando meu ‘ser’. Construindo, demolindo, refazendo, a cada dia. Com buscas, mudanças, perguntas, respostas provisórias, novas percepções. É possível que em mim uma cidade inteira esteja em processo de desenvolvimento. Mas para os meus contemporâneos isso é muito abstrato. Imaginário. A eles interessam apenas edifícios tangíveis; com boa estrutura e arquitetura criativa... Esse tipo de visão é perigosa. Tanto que às vezes penso que fui contaminado. Eu mesmo me cobro. Fico chateado por estar tão atrasado na corrida da vida, no jogo do ter. Deram a largada e eu creio que fiquei largado. Enquanto outros correm eu vou andando devagar, observando as belezas do percurso. Sem nem mesmo me lembrar da linha de chegada. E como o caminho é belo! É triste pensar que todo o trajeto – tantos quilômetros, tantos anos, tanta vida – seja visto como insignificante quando comparado aos troféus da linha de chegada, ou às posições do pódio. É, estou contaminado. E o primeiro sintoma é o medo. Medo de que passados mais vinte e cinco anos eu ainda esteja parado no mesmo trecho, observando uma árvore, ou sentado, encostado em seu tronco, sob sua sombra. Como posso ter medo desta imagem, deste sonho? O triste é que tenho. São patologias oriundas da contaminação. Deliro: durante o trajeto paro para descansar. Aproximo-me de uma linda árvore, na intenção de desfrutar do frescor de sua copa, e ali durmo. Começo a sonhar com o impossível. E quando acordo... Quando acordo já passou muito tempo. Não consigo mais voltar para o caminho. Não consigo mais correr. Nem sei mais falar a língua dos corredores. Transformei-me em cigarra... Passei o tempo de correr descansando. Sou uma cigarra. E ser formiga é que é preciso. Na fábula a cigarra sofre no final. Se bem que isso é história ficcional. É possível que mesmo que eu seja cigarra o meu final seja diferente. Até porque, final de história livro essencialmente já é diferente de final de história real de gente. É possível saber o final da história de livro. Basta olhar na última página. Na história real a última página é tão imprevisível quanto próxima letra. E o fim pode ser qualquer um em qualquer momento. Daqui a pouco. Amanhã. A exatos dois meses. Aos vinte e cinco, talvez. De repente pode ser a última linha. E após a última palavra... O que foi concretizado, a velocidade empenhada, as medalhas, as posições alcançadas, se tornam lindas lembranças. Apenas lembranças... Nada como um pouco de reflexão para curar temporariamente contaminações tão profundas.